Há quem diga: "deixe as crianças serem crianças, não precisa acelerar o processo pois cada um aprende no seu tempo". Esta afirmação é perigosa porque carrega consigo apenas meias verdades. Por que levar essa afirmação a ferro e fogo vai prejudicar o desenvolvimento dos seus filhos?
No meu primeiro dia da escola primária, lembro-me como se fosse hoje, fui à pequena escola do bairro em que morava acompanhado pela minha mãe e meu irmão do meio, 5 anos mais velho do que eu, quando chegamos uma professora já de idade, uma senhora, correu até minha mãe com uma lista de chamada nas mãos para ver se eu seria seu aluno.
Essa senhora era amiga da minha mãe, por isso ela veio toda animada para saber se eu seria seu aluno, por ironia do destino eu não estava na sua turma. Ela lamentou e depois de alguns minutos de conversa corriqueira com minha mãe se despediu.
Esse evento simples, sem nenhum relevo, mudou toda a minha jornada de estudos.
Ainda me recordo de algumas cenas desse dia, apesar de não terem nenhuma importância, são engraçadas. Uma delas, foi o meu irmão me mostrando onde era o banheiro, ele fez questão de me levar até o banheiro e dizer: “- Quando você precisar usar o banheiro, venha aqui”. Respondi: “- Claro, é o que fazemos naturalmente!”. Mas ele me contou, depois, o porquê de ter me mostrado onde ficava o banheiro.
No seu primeiro dia de aula, ele não sabia onde ficava o banheiro e por causa disso teve que planejar uma forma de urinar sem que fosse notado, então, esperou terminar o intervalo e quando todos voltaram para as suas salas, ele foi discretamente atrás das árvores do pátio da escola.
Só depois descobriu que havia banheiros na escola e que toda a sua sagacidade tinha sido em vão. Era só perguntar para alguém onde ficava o banheiro. Mas crianças têm dessas coisas, para elas, criar os planos mais mirabolantes para executar tarefas simples parece fazer sentido, por algum motivo desconhecido.
Apesar de cômica ou trágica essa história do meu irmão, como disse, ela não tem nenhuma relevância para o nosso propósito aqui, o mais importante foi o fato da professora, uma senhora amiga da minha mãe, querer saber se seria seu aluno. E por que isto é importante e tem muita relevância?
Porque eu acabei caindo em uma turma com uma professora novata, era uma boa professora, porém, acredito eu, recém-formada. Foi com ela que aprendi a ler, escrever, fazer contas, enfim, fiz toda a minha formação da escola primária. Provavelmente, a formação dessa professora foi muito diferente da formação da senhora que dava aulas para a outra turma. Não sei se ela acreditava que o melhor é deixar as crianças serem crianças, mas sei que todos gostavam dela, pois era muito simpática e jovem e, por contraste, todos morriam de medo da outra professora mais velha, pois ela era muito mais exigente e “caxias”.
Não só, provavelmente, a formação dessas professoras era diferente, mas com toda certeza, mais do que isso, os resultados que as duas entregavam eram diferentes, o desempenho das crianças dessas duas turmas era completamente diverso, uma com a professora recém-formada e a outra com uma senhora. E como eu sei disso? Este pequeno colégio era um colégio de bairro, então, eu conhecia todo mundo que estudava lá. Uma amiga de infância que eu frequentava sua casa e conhecia toda a sua família teve a sorte de estudar com a professora mais velha.
Acabamos nos encontrando e estudamos juntos no quinto ano, ou seja, no ensino fundamental, logo depois do primário. E como éramos amigos bem próximos, fazíamos as tarefas juntos e conversávamos bastante. Era nítido a discrepância entre as nossas formações em matemática, leitura e escrita. A minha amiga era bem melhor do que eu, ela tinha recebido uma formação no ensino primário muito melhor que a minha. Mesmo eu sendo uma criança percebia essa diferença de qualidade em relação as nossas formações.
Por que essa história é relevante e pode nos ajudar a refletir? Ela nos mostra que é nos primeiros anos de vida, principalmente na primeira infância, a fase mais importante da nossa formação, se não recebermos uma instrução adequada nesse período vamos carregar dificuldades nos estudos para o resto da vida.
Principalmente quando estamos falando do aprendizado da leitura e da escrita, é na primeira infância o melhor momento para desenvolver as crianças para a aquisição dessas habilidades. Quando deixamos passar esse momento ou quando não desenvolvemos bem as crianças nessa fase, elas terão um baixo rendimento em leitura fluente e, por consequência, nos estudos em geral.
Existe uma relação direta entre a leitura e o que é chamado na sociologia de "Efeito Matheus", ou seja, quanto mais competências as crianças desenvolvem nessa fase, mais ela consegue progredir e se desenvolver, assim como o inverso também ocorre, quanto menos ela se desenvolve, menos ainda ela consegue progredir e se desenvolver.
Abordamos este tema do "Efeito Matheus" com mais detalhes em um artigo sobre avaliações, onde demonstramos as consequências desse fenômeno para o desenvolvimento infantil.¹
Com certeza as crianças devem ser crianças, mas existem certas habilidades e fases do desenvolvimento infantil que são fundamentais para o bom desempenho delas e é possível avaliar de forma simples e objetiva se estão progredindo. Um detalhe muito importante, é possível desenvolver as crianças de forma objetiva e divertida ao mesmo tempo. Quem disse que desempenho e resultado estão de mãos dadas com rigidez e abandono da infância?
A diferença entre duas crianças, por um lado uma que foi bem desenvolvida na primeira infância e, por outro lado, uma que deixaram ela apenas ser criança, é tão gritante que até as próprias crianças percebem.
Existem trabalhos e pesquisas robustas que já analisaram essa diferença, um dos mais famosos, o "Desenvolvimento da Alfabetização Precoce"², fez uma meta-análise de centenas de estudos a respeito do tema, a conclusão foi que grupos de crianças que possuem determinadas habilidades e competências pré-escolares, conseguem um melhor desempenho em competências leitoras em relação às que não possuem essas habilidades e competências.
Isto é tão evidente que, mais tarde, depois de me formar na universidade, fui dar aulas no ensino fundamental e médio e percebi a mesma diferença de qualidade do ensino primário dos meus alunos. Aqueles que conseguiam acompanhar a matéria e faziam com facilidade os exercícios propostos na disciplina eram os mesmos que sabiam ler e escrever adequadamente, ao passo que aqueles que tinham dificuldades eram os mesmos que tinha defasagens em leitura e escrita.
Então, se você não quer cair no canto da sereia ao repetir frases bonitas que, à primeira vista parecem fazer sentido, mas que na prática são perigosas e um veneno para a formação das crianças, clique aqui, e assista a uma apresentação gratuita do método Alfabetização Diária, onde demonstramos como funciona um passo a passo para você ensinar seus filhos ou seus alunos a ler e escrever bem, de forma prática e objetiva.
Até o próximo artigo.
Referências
1. A. E., & Stanovich, K. E. Early readingacquisitionand its relationtoreadingexperienceandability 10 years later. 1997.
2. National Early Literacy Panel. Developing Early Literacy: A Scientific Synthesis of Early Literacy Development and Implications for Intervention. 2008.
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